Grupos de comunicação em crise, falta de interesse da população brasileira pela leitura, baixo poder aquisitivo e alto custo da informação, saturação do mercado, entenda as possíveis causas da morte das revistas
Demissões em massa e fechamento de diversas revistas já consolidadas, como por exemplo a Cosmopolitan, Elle, Mundo Estranho, VIP, da editora Abril, entre tantas outras de uma lista de pelo menos dez cancelamentos, foi o sinal definitivo que a crise que o grupo já vinha enfrentando desde 2015, havia chegado ao seu ápice, deixando os apreciadores das revistas, estudantes de comunicação e profissionais do meio com a sensação de que o veículo está fadado a morrer.
Carla Tôzo, professora de revista do FIAM-FAAM afirmou que a falta de interesse pela leitura, mais especificamente do veículo revista, muitas vezes vem da falta de habilidade dos profissionais do meio em se comunicar com jovens, o texto ainda é antiquado e pouco atraente para a geração atual, que já nasceu com a internet e consome a maioria do seu conteúdo na rede. Carla é uma otimista que se apresenta como tal e apesar de admitir que a crise está aí para todo mundo ver, acredita que o que estamos assistindo não é a morte definitiva das revistas.
“Se fosse um colapso ninguém mais vendia e as outras editoras não investiriam”, afirma a professora fazendo referência ao fato de que ao mesmo tempo que a Abril entrou em crise a editora Globo teve um momento de ascensão, usando o exemplo não só como meio de justificar sua fala, mas de tranquilizar os desesperados.
Luís Nogueira, diretor de redação na Editora Globo, mesmo não negando a crise que o impresso vem enfrentando, acredita que a crise do grupo Abril esteja mais relacionada a uma crise de modelo empresarial do modelo de negócio do que uma falência por causa da revista.
“Obviamente toda informação que é paga tem uma dificuldade por causa da crise econômica que o país enfrenta que já dura quase cinco anos. E isso fez parte da tempestade perfeita da crise do modelo de jornalismo impresso.”
Carla acredita que não há apenas um fator responsável pela queda no número de vendas de revistas e sim uma sucessão deles, produzir revista sai muito caro, portanto é impossível baixar o custo, ficando fora de margem da população brasileira, que ganha mal. O mercado está saturado, tudo já foi feito e tudo que aparece novo não é de fato novo é só mais do mesmo numa roupagem diferente, as vezes sequer a roupagem é diferente. Sobre isso Carla provoca com uma risada: “Não vejo que está fadado a morrer, mas também não precisa de 399 revistas femininas ou 399 revistas de esporte, vulgo futebol”.
A declaração de que tudo já foi feito e nada parece inovador, que a professora lança, é rebatida por Nogueira, que acredita que há sim conteúdo inovador surgindo porém em áreas muito específicas e com pouco alcance, fazendo com que o público leitor geral não conheça.
“Eu acho que existe muita coisa inovadora e de nicho, vem para quebrar barreira. Quando deixa de ser ‘mainstream’ e vem para o público geral, é copiado e deixa de ser inovador.”
Afirmando também que quando esses conteúdos nichados são descobertos e reproduzidos, deixam então de ser inovadores. Ao lembrar que já viu bastante conteúdo internacional inovador, ressalta que no Brasil temos uma cultura mais rígida que não dá abertura para esse tipo de experimentação. Isso em todas as áreas de conteúdo não apenas na produção de revistas.
“Aqui no Brasil existe uma dificuldade de inovação não só no meio revista, mas em todos os meios, porque não existe uma cultura para experimentar as coisas” (Luís Nogueira)
Monica Manir da revista Piauí conta que é difícil antecipar o futuro do veículo após o baque causado pela crise da Abril e ela acredita que uma das saídas é a migração do impresso para o digital, e que é sim possível ler uma matéria grande no meio digital. “As pessoas têm folego para ler matérias grandes no celular, você pega uma matéria gigante da New Yorker e vai lendo, ela não acaba no seu celular e você vai lendo, porque é uma história boa.”
A jornalista afirma, concordando com Carla, que há relação entre os custos que são gerados na produção jornalística. Ela se recorda de uma matéria para a Piauí para a qual teve de ir para Itália, com os custos sendo bancados pela revista, e o quanto isso é raro atualmente, por gerar gastos.
“Jornalismo custa e é difícil levar adiante sem que tenha alguém por trás."
Carla por sua vez, acredita que embora o jornalismo digital esteja se consolidando, ainda não existem revistas digitais que são efetivamente com forma de revista. São apenas PDFs que tentam usar a mesma linguagem usada nas revistas impressas. Ela ressalta que a única vez que viu uma revista digital com cara de revista foi em um TCC e que esse exemplo pode justificar o motivo desse modelo ainda não ter ganhado popularidade. “A aluna teve que contratar um programador para mexer com HTML. Jornalista não sabe programar”, diz. Se os custos estão sendo cortados e cada vez mais o jornalista precisa assumir diferentes funções, é muito mais prático que se disponibilize um PDF sem cara de revista do que gerar custos contratando um profissional para fazer especificamente a programação. Ainda há o fato de que se um programador for contratado, o custo de produção sobe e o de distribuição ao cliente final também, o Brasil já é um país que consome pouco conteúdo digital pago, se ficar ainda mais caro seria um tiro no pé.
“O brasileiro não quer pagar por conteúdo."
Entretanto, como uma boa otimista, a professora afirma que embora o custo para se produzir revistas nunca vá diminuir, as revistas não vão chegar a realmente morrer, no máximo terão que se adaptar aos novos tempos e isso não está apenas em migrar para o meio digital mas mudar a periodicidade de suas tiragens, o tamanho de suas publicações, pensar ainda na possibilidade de manter um site com periodicidade comum, semanal, quinzenal ou mensal e trazer para o impresso apenas edições especiais com conteúdos extras exclusivos, justificando o custo e trazendo a vontade do leitor de consumir. E ainda afirma que as revistas semanais sim estão fadadas a morrer, explicando em seguida que não vão deixar de existir e sim ter de adaptar seu formato, brinca por exemplo com o fato de revistas de fofoca não darem mais certo hoje em dia por causa das redes sociais.
“As revistas semanais estão mais fadadas a morrer."
O diretor por sua vez, afirma que as revistas não vão morrer, e que nem tudo vai migrar para o digital porque existem veículos que proporcionam experiências que são impossíveis de serem transmitidas da mesma forma que no impresso no online. E concordando com Carla diz que no máximo as publicações vão mudar de tamanho, como já está sendo visto em diversas publicações.
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